2007 July 13 15:19:37 BRT

Mais causos

Cansado de ver a Lady boiar nos meus artigos técnicos, resolvi contar uns causos… Só pra variar…

Tia Carmem

Não lembro direito quando foi (eu nem era vivo, eu sei, mas já me disseram as datas aproximadas e eu já me esqueci) que os eventos desse causo aconteceram. Mas sei que foi a muito, muito tempo atrás, numa BH não muito distante.

Tia Carmem era tia da minha mãe. Foi a última dos irmãos da minha avó a falecer, e também a que eu tive mais contato. A outra tia avó que tive algum contato foi a Tia Dulce, mas ela morreu quando eu ainda era criança. Além do que, os causos da tia Carmem sempre foram mais engraçados.

Ela foi uma das primeiras mulheres de BH a ter carteira de motorista (alguns dizem que foi a segunda mulher a tirar carteira em Minas, mas não sei confirmar isso). Quando voltava pra casa, ali na Rua Chumbo (hoje Rua Estêvão Pinto), na serra, as mães já tiravam as crianças da rua uns 15 minutos antes:

  • Crianças, venham pra casa porque está na hora do automóvel da dona Carmem passar.

Não que ela fosse má motorista, pelo contrário! É que “carro” por si só era uma coisa rara, e as mães morriam de medo de uma criança ser atropelada por aquelas coisas estranhas.

O causo mais antigo que tenho notícia da Tia Carmem era que ela tinha subido a escadaria da Igreja São José num Fordinho (aqueles Fords modelo T antigos, sabem?). Esse caso sempre rodou pela família toda, e ninguém nunca conseguia confirmar. Era verdade? Tinha quem dissesse que que saiu reportagem sobre o feito no Estado de Minas. Mas ninguém sabia ao certo.

Mas tinham outros casos. Minha avó (e minha Tia Patrícia depois) gostavam de contar que num dia de chuva (e na época nao existia TV, quem dirá internet, e quiçá nem mesmo tinham rádio em casa), entediados e sentados todos na sala, conversando, Tia Carmem resolveu arrumar diversão:

  • Faço uma aposta: consigo abrir o portão de casa sem sair do carro, igual fazemos para abrir porteira quando estamos montados a cavalo.

(Pra quem nunca foi na roça, animais urbanos que somos hoje, a gente leva o cavalo até o lado da porteira fechada, puxa a “maçaneta” ou seja lá como chama aquela fechadura de porteira e segurando a porteira vai dando ré com o cavalo. Em geral as porteiras são inclinadas, então basta passar da porteira depois de aberta que ela se fecha sozinha).

Pois entraram todos no carro, Tia Carmem no volante, os irmãos atrás e meu bisavô no banco do passageiro. Foram pra rua e fecharam o portão. E Tia Carmem manobrava o carro, chegava do lado do portão, tentava achar a posição certa, mas na hora H não conseguia segurar o portão e tinha de tentar de novo.

Tentou por uns 15 minutos ou meia hora, quando o vizinho veio a janela e viu a cena. Comovido, calçou as galochas, a capa de chuva e de guarda chuva em riste, veio até o carro:

  • Dr. Estevão, o Senhor saiu sem guarda chuvas, não foi? Não precisa se preocupar, eu abro pro senhor o portão.

Com vergonha de dizer que era só uma aposta, ainda mais depois de o vizinho ter se prontificado a ajudar, voltaram todos pro tédio da sala de casa, sem TV, sem Rádio ou internet. E principalmente sem saber se a Tia Carmem conseguia ou não abrir o portão.

Muito tempo depois estávamos no Lote [1], e a Tia Carmem também estava lá. Ela ia sempre ao Lote, e as vezes alguns netos dela também iam. Criamos todos coragem e resolvemos perguntar:

  • Tia Carmem, é verdade que você subiu a escadaria da Igreja São José de fordinho?

Indignada, ela respondeu:

  • Que mentira, nunca subi as escadarias da Igreja São José! Só desci!

girino 15:49, 13 Julho 2007 (BRT)

Notas

  1. ? O Lote é um lugar etéreo num dos condomínios de nova lima, próximo ao Clube Campestre de Belo Horizonte, onde a família se reúne aos domingos. Originalmente era só um lote vago, comprado por meu avô, onde ele ia cuidar das plantas. Com o tempo as plantas cresceram e brotou uma casa, uma garagem e outra coisas do gênero, ninguém sabe de onde. O Lote continuou sendo o nome desse lugar etéreo, que pra quem via de fora era uma mera casa de campo, mas pra família ia ser sempre O Lote.


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